Que políticas públicas são necessárias para a economia solidária?
Reconhecimento juridico e apoio institucional à ESS
Alguns governos optaram por considerar definitivos seu reconhecimento e seu apoio à economia social e solidária. Para além das orientações de cada partido ou da conjuntura econômica, estas medidas, que podem ser leis, novas instituições ou processos de certificação, estão ratificadas em leis que asseguram sua sustentabilidade. A imutabilidade dessas estruturas com frequência torna mais fácil o trabalho de colaboração entre as autoridades do governo e favorece o processo de colaborações construtivas e intersetoriais com os atores da economia social e solidária.
Compras públicas, alavanca da transformação
Nas últimas décadas, em muitos países foram implementados sistemas cooperativos e associativos, em particular no serviço à pessoa, assumindo funções sociais não atendidas pelo Estado ou pelo mercado: educação, saúde, inserção social, etc. Se nós reconhecemos que a economia social e solidária tem (como em certa medida é o caso do Canadá, por exemplo) potencialidades evidentes como ferramenta eficaz para tratar certos temas ligados às políticas públicas (primeira infância, parcerias solidárias entre agricultores e consumidores, visando a uma alimentação local e de qualidade, sustentabilidade do meio ambiente, soluções energéticas sustentáveis, etc), esse reconhecimento deve estar acompanhado pela implementação de políticas públicas e de regulamentações que favoreçam essas potencialidades. É necessário contar com um novo quadro de políticas públicas que dê prioridade aos valores da transição econômica: participação, co-construção, reciprocidade, cooperação e co-decisão.
As cidades, actores da mudança
Em termos de políticas públicas, a cidade está localizada em uma escala próxima às necessidades dos habitantes. Jovens, idosos, pessoas afastadas do trabalho, saneamento, gestão de resíduos, mobiliário urbano, planeamento do espaço público, mobilidade, energia, educação, saúde, não faltam temas. A cidade constitui um ecossistema complexo (natural, patrimonial, cultural, humano) que deve ser cuidado diariamente. Em todo o mundo, os governos locais e os municípios, muitas vezes em consulta com representantes da sociedade civil, estão a responder às várias crises sociais, económicas e/ou ambientais nos seus territórios. A proximidade com governos locais, dependendo do tamanho das cidades, pode levar à criação de laços estreitos e à tomada em consideração da experiência dos seus habitantes na utilização da cidade, que se tornam então co-produtores de políticas públicas que os afectam directamente.
Co-produção e co-construcção das políticas públicas : o papel da ESS
Yves Vaillancourt (2014) identifica os conceitos de co-produção e de co-construção das políticas públicas. Estas fazem referência, por um lado, à participação dos atores da sociedade civil e do mercado, na implementação das políticas públicas (a gestão e a prestação de serviços, por exemplo) e por outro lado, à participação dos atores na definição ou a elaboração das políticas (identificação das orientações gerais e dos elementos fundacionais das políticas).
Público-alvo das politicas publicas
As empresas da economia social e solidária contribuem de forma ativa para assegurar a melhor participação social e econômica de alguns grupos ou pessoas que enfrentam diversos obstáculos que lhes impedem o acesso ao mercado de trabalho e aos bens e serviços produzidos pela economia tradicional. Em lugar de investir exclusivamente em programas relativos à renda, a economia social e solidária busca encontrar meios para tornar mais autônomas as populações-alvo com as quais trabalha. Esta abordagem interessa aos governos, que investem em programas que visam a apoiar a integração socioeconômica dos grupos-alvo (os jovens, pessoas incapacitadas, imigrantes recém-chegados ao país, comunidades autóctones). Assim, em certos países, a economia social e solidária é parte integral das estratégias do mercado de trabalho.
Políticas que favorecem um segmento econômico
Alguns segmentos econômicos apresentam perspectivas mais que interessantes para as empresas da economia social e solidária. Estas empresas com frequência são criadas como resposta às necessidades que nem o mercado, nem o governo podem satisfazer, mas há também empresas da economia social e solidária nos mercados lucrativos. Por meio de uma combinação de recursos do mercado, de contribuições voluntárias e do apoio público, o empreendimento da economia social e solidária tem um papel decisivo, já que contribui a estruturar alguns mercados ou a garantir que as repercussões destes mercados sejam coletivas e ao mesmo tempo atendam de maneira eficiente os requerimentos de certos tipos de produtos e serviços. As políticas que favorecem o surgimento ou o fortalecimento de determinados segmentos econômicos (entre outros, meio ambiente, serviços pessoais, moradia, novas tecnologias, comunicações, turismo, serviços de alimentação, cultura e muitos outros) representam, portanto, ferramentas importantes para o desenvolvimento da economia social e solidária.
Políticas públicas para favorecer o desenvolvimento territorial
As empresas da economia social e solidária são criadas em coletividades que se mobilizam para favorecer o desenvolvimento. Com frequência constituem a única opção para as coletividades marginalizadas quando os investidores privados as abandonaram ou não encontram interesse em mercados menos rentáveis ou em regiões distantes. Assim, para favorecer o desenvolvimento social, cultural e econômico de seus territórios, existem governos de ordem municipal, regional (toda entidade subnacional, província, região, estado, etc.), nacional ou internacional que lançaram iniciativas para facilitar a criação e o crescimento destas empresas. Do seu lado, para as coletividades locais, o fato de poder contar com uma política pública para formar redes, estabelecer processos de planejamento estratégico e implementar projetos coletivos constitui um fator imprescindível de êxito.
Políticas públicas que favorecem ferramentas financieras adecuadas para la ESS
Um dos principais desafios para as empresas da economia social e solidária é obter o financiamento suficiente e em condições aceitáveis para tornar possível seu desenvolvimento. Os governos podem facilitar o acesso ao capital reconhecendo o caráter particular destas empresas, permitindo-lhes a alocação de recursos próprios, adotando medidas fiscais que incentivem os atores privados a investirem também ali, contribuindo para fundos de investimento dedicados a elas ou criando ferramentas financeiras específicas para estas empresas ou organizações que as apoiam.
Medidas genéricas em favor do desenvolvimento da ESS
De igual forma que as empresas privadas, as empresas da economia social e solidária devem ter acesso aos mercados adequados, acesso à pesquisa e ao desenvolvimento bem como a recursos que lhes permitam exercer práticas de gestão eficiente. Entretanto, os programas e políticas pensados para o setor privado, com frequência, precisam ser adaptados para satisfazer as necessidades das empresas da economia social e solidária. Ferramentas especialmente desenhadas para as empresas da economia social e solidária permitem colocar todas as empresas em igualdade de condições, as características próprias de cada uma das organizações são reconhecidas, e o mais importante ainda: a sua contribuição para atingir os objetivos sociais, meio-ambientais ou culturais, os quais, sem esta contribuição, precisariam de formas muito mais onerosas de investimento por parte do governo. Neste sentido, as políticas e os programas em favor das empresas da economia social e solidária não constituem uma competição injusta para o setor lucrativo baseado na propriedade privada. Pelo contrário, permitem que empresas da economia social e solidária tenham os meios de serem competitivas no mercado sem por isso comprometer seus objetivos sociais ou meio-ambientais. Em muitos casos, quando as empresas da economia social e solidária já criaram um espaço para elas nos mercados e se tornaram rentáveis, a ajuda de longo prazo por parte do governo não é necessária.